sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

O Andarilho - Manoel de Barros

Eu já disse quem sou Ele.
Meu desnome é Andaleço.
Andando devagar eu atraso o final do dia.
Caminho por beira de rios conchosos.
Para as crianças da estrada eu sou o Homem do Saco.
Carrego latas furadas, pregos, papéis usados.
(Ouço arpejo de mim nas latas tortas.)
Não tenho pretensões de conquistar a inglória perfeita.
Os loucos me interpretam.
A minha direção é a pessoa do vento.
Meus rumos não têm termômetro.
De tarde arborizo pássaros.
De noite os sapos me pulam.
Não tenho carne de água.
Eu pertenço de andar atoamente.
Não tive estudamento de tomos.
Só conheço as ciências que analfabetam.
Todas as coisas têm ser?
Sou um sujeito remoto.
Aromas de jacintos me infinitam.
E estes ermos me somam.

5 comentários:

  1. Negritaria "os loucos me interpretam". Essa frase traz a personalidade do louco, a característica de loucura em si como algo fingido e ensaiado, sendo dele algo inato e puro.

    Também "meus rumos não tem termômetro", com a idéia de que ele não vê o jeito, a cor, o termo, o tamanho, o ensejo, o clima, o quente ou frio de uma vereda por qual venha a trilhar...

    Vc negritou coisas boas tbm.

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  2. Erica, estou logada na conta da minha mãe, sou eu Prish tah.

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  3. Qdo disse "dele algo inato e puro" é *dele* Manuel, não do louco.

    rs
    chega

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  4. Minha idéia com o negrito-itálico é justamente *transparentar* os instantes de que diz o título do blog. Legal que você tenha sido atenta a isso. E mais legal que tenha dito o que você "negritaria" (rs, ótima palavra!). Mostra como pessoas diferentes percebem instantes diferentes...
    Para mim, as epifanias estão nas já negritadas no post.
    Negritadas... essa palavra me faz pensar em "italicadas".

    Érica.

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